
O amor dos pais - do “trauma” ao “mais” da vida
Os que procuram por uma escuta atenciosa às suas dores e dificuldades do dia a dia talvez em algum momento já tenham ouvido falar sobre o “trauma original” e como ele é decisivo nos movimentos que fazemos ao longo da vida. Mas o que é o “trauma original”? Como ele pode ser decisivo em situações de enfrentamento e na resolução de problemas que atravessam nossas vidas? E o que nossos pais podem ter haver com isso?
Podemos reconhecer uma situação de trauma, por exemplo, na primeira infância. Nessa idade, quando nossa existência ainda conhece e apreende o mundo, e as relações que estabelecemos com o mundo são estruturadas, muitas vezes nosso ser experimenta um sentimento de abandono. Esse sentimento diz respeito a um movimento que fazemos em direção a algo ou alguém e que não é possível completar, seja porque algum caminho em nossa jornada sofre um desvio, seja porque aquele para o qual nos dirigimos não corresponde a uma expectativa. Essa incompletude gera em nós uma espécie de vazio, muitas vezes fazendo com que nos sintamos abandonados. Quando somos crianças, assim, experimentamos essa espécie de abandono quando queremos estar com nossos pais, mas eles, por inúmeras circunstâncias que a vida apresenta, não estão presentes.
Ao longo da vida, essa natureza de sentimento, se não liberada, pode gerar em nós dores emocionais. A alma, quando adoecida, tende então a se apegar e transitar por estados negativos, responsáveis por quadros de ansiedade, pânico, isolamento e depressão. No entanto, o processo de cura não está tão longe de nós quanto imaginamos. Ele começa sempre com a decisão de mudar a ordem com a qual a vida avança. Dessa decisão partimos em busca de uma escuta cuidadosa nas salas de psicoterapia como também de um retorno ao contato com nossas ligações mais íntimas e primeiras da vida.
O retorno às ligações antigas é um retorno geracional, onde voltamos a escutar e estabelecer novas ligações com nossos pais e nossos antepassados. As imagens de dor e as situações que nos parecem difíceis nos acompanham ao longo de toda a vida, mas reconectados com aqueles que nos deram a vida e fortalecida nossa interioridade, podemos sempre nos movimentarmos em direção ao “mais” da vida.
Assim, meditando para onde a nossa alma vai, seja no trabalho, nas relações, nos filhos, no amor, na saúde, deixamos de retrair nossa vida para o “menos” e seguimos na direção do do mais. Retomamos, com nossos antepassados, imagens de confiança, de conquistas, das partilhas felizes, de nutrição. Aos poucos, então, num processo de cura, tomamos consciência de que meditar para o mais é sempre meditar para o êxito. Deixar fluir a vida que nos foi e nos é transmitida.